terça-feira, 24 de abril de 2012

O maior mico da história do metal

















O que era para ser o principal evento do gênero na América Latina, no Maranhão, virou amontoado de mentiras e desrespeito com uma legião de fãs, humilhada pelos produtores

Ricardo Novelino
do Jornal do Commercio

A cena era mesmo surreal. No Parque Independência, na periferia de São Luís, no Maranhão, pairava um sentimento coletivo de revolta, frustração e indignação. O primeiro Metal Open Air (MOA), vendido ao público de todo o mundo como o maior festival dedicado ao heavy metal da América Latina, chegava ao fim de forma precoce e melancólica. O Korzus, banda paulista escalada para tocar no sábado à tarde, encarava a plateia, beirando a meia noite, para tentar, ao menos, dar um caráter de respeito à despedida. Depois de tocar três músicas, o vocalista Marcello Pompeu comandou momentos de catarse para aliviar o clima entre os headbangers. 

Gente de várias partes do Brasil e de outros países, uma legião de humilhados, foram enganados pelos produtores. Coube a Pompeu a iniciativa de expurgar a raiva com um gesto simples. Convidou os jornalistas para subir ao palco principal, já que o outro era desmontado enquanto o show acontecia, e comandou a execução de estrofes do Hino Nacional Brasileiro, à capela. Eram os bangers, maioria esmagadora de preto, usando símbolos e cores nacionais como forma de enfrentar aqueles momentos. 

Um público formado por excluídos e renegados da cultura considerada tradicional gritou "gigante pela própria natureza", reuniu as últimas forças para suportar a situação tão irreal quanto a possibilidade de acontecer tanta coisa ruim em tão curto espaço de tempo, como de fato ocorreu. O Metal Open Air ganhou o mundo não pela qualidade dos shows, mas pela capacidade de pessoas sem escrúpulos de destruir sonhos. O MOA virou um grande mico. Um mico mundial.

Quem foi a São Luís acompanhou o nascimento e o assassinato de uma bela ideia. A euforia das primeiras horas da tarde da sexta-feira, no aeroporto, contrastava com o cenário desolador do domingo à tarde, horas depois do cancelamento oficial do festival. Nas ruas, a cada esquina, grupos de sotaques e línguas diferentes. Bares lotados, cervejas nas mãos e brilho nos olhos de quem deixou família em casa, pegou ônibus ou avião e gastou R$ 450 para curtir três dias de metal.

A promessa era grande: 46 bandas em dois palcos. Apenas 12 aconteceram. Medalhões de todas as vertentes do estilo iriam ao Maranhão. No peito, cada um mostrava sua preferência nas estampas das camisetas. Depois, a lama cobria as roupas e as barracas de quem queria acampar e foi expulso dos estábulos do parque de exposições de animais, sem direito a nada.

Como se não bastasse o desrespeito e a falta de consideração dos organizadores, que não explicaram o que de fato aconteceu, quem caiu do cavalo em São Luís teve que aguentar mentiras, boatos e justificativas infantis. A ficção criada pela Lamparina Produções, produtora local, e a Negri Concerts, agenciadora internacional, começou a ruir por causa de um grito isolado líder do Hangar, Aquiles Priester. O batera jogou a primeira pedra e denunciou não ter recebido cachê, ainda na quinta-feira. Parecia um problema pontual. Mas ninguém disse nada. E muita gente embarcou, literalmente, naquela viagem. 

Em vez de explicar, Natanael Jr., da Lamparina, e Fábio Negri, se esconderam o quanto puderam. Não houve comunicado oficial até o domingo de amanhã. No local do evento, uma central de boatos replicava informações. Quando os responsáveis - ou irresponsáveis - apareceram, já era tarde. Com isso, surgiram baixarias e denúncias de agressão e intimidação entre os cabeças do MOA. Lamentável, como tudo o que ocorreu.

Muitas perguntas ficaram sem respostas. E talvez fiquem para sempre. A não ser que as ações coletivas prometidas por fãs mais revoltados cheguem à justiça. Quem sabe, o mundo inteiro não saberá o que foi feito com a verba arrecadada com patrocinadores, governo do Maranhão e Prefeitura de São Luís. Cadê os R$ 5 milhões aprovados para o projeto? Quem pagou passagem, hospedagem e passaporte do MOA vai ser ressarcido?

Vamos esperar para ver. O tempo pode até trazer reparos financeiros, mas não apagará a triste memória. Pobre da cena metal brasileira, que ainda tem que aguentar picaretagem desse nível. E que o mico internacional do MOA não destrua anos e anos de dedicação e trabalho de produtores competentes que realmente gostam do estilo. Bola pra frente. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário